
Em Cabo Frio, o jogo político virou mitologia viva. O prefeito, Dr. Serginho, reina como Zeus, o deus supremo desse Olimpo municipal. Abaixo dele, cada vereador, cada secretário e cada figura de influência funciona como um “deus menor”, com seu próprio arsenal: aliados, grupos privados e, principalmente, portais de notícias que operam como tropas digitais particulares.
Só que tem um detalhe: esses portais não só servem aos deuses, eles moldam a realidade. Zeus, do alto de seu trono, controla boa parte desses veículos, que por sua vez filtram, reorganizam e despejam diariamente a fantasia de que vivemos numa Cabo Frio das Maravilhas, onde tudo funciona, ninguém reclama e antigos problemas evaporaram como mágica. A cidade ideal existe, mas só dentro dos portais.
E os deuses menores? Esses aprenderam rápido. Entraram na regra do jogo e seguem a cartilha: silêncio absoluto. Os mesmos vereadores que em outras gestões batiam na mesa, cobravam transparência, denunciavam abandono e clamavam por soluções hoje esqueceram tudo. Submeteram-se ao Olimpo. Viraram figurantes de luxo: falam pouco, questionam nada e aplaudem tudo. Até os absurdos.
Enquanto isso, fatos ao arrepio da lei vão se acumulando no currículo do prefeito, mas como Zeus tem o comando dos raios e dos portais, ninguém ousa lembrar, registrar ou confrontar. Se não saiu nos portais, não existe. Eis o milagre.
Mas a guerra entre deuses começou a vazar pelas nuvens.
O episódio recente deixou tudo escancarado: um portal ligado a um deus menor resolveu atacar dois outros deuses, os vereadores Dr. Luis Geraldo e Vanderlei Bento, acusando-os de traição por dialogarem com a pré-candidata a deputada estadual Daniele Martins, esposa do prefeito de Búzios, enquanto Aline Rabelo, também pré-candidata e esposa do Zeus de Cabo Frio, está em tratamento de saúde. A “deslealdade” virou narrativa oficial do portal, não porque fosse grave, mas porque era útil ao deus que o comanda.
Esse ataque não é só uma fofoca política. É o primeiro raio numa tempestade que, se avançar, pode virar o estopim da ruína. Porque se um portal resolve desferir golpes contra deuses vizinhos, imagine quando os outros portais, cada um fiel ao seu próprio deus, resolverem entrar no jogo. Aí a harmonia artificial racha e a guerra se instala de verdade.
E guerra entre deuses nunca termina bem.
A cidade, sem oposição formal e com uma imprensa domesticada, vive dentro de um teatro onde o cenário é lindo mas o backstage está pegando fogo. Não é a crítica externa que ameaça o Olimpo, essa já foi silenciada. O risco real é o fogo amigo: as disputas internas, as vaidades descontroladas, os portais transformados em espadas e escudos pessoais, a submissão dos vereadores e a crescente coleção de atos ilegais que ninguém ousa apontar.
Quando os deuses começam a atacar uns aos outros, o Olimpo desmorona por dentro. E nesse caos fica mais evidente o que os portais tentam esconder: Cabo Frio não virou a cidade das maravilhas que eles vendem todos os dias. Vive de narrativas, não de resultados. A pergunta que sobra é simples e direta: será que este colunista está exagerando… ou a vida realmente não melhorou coisa nenhuma?